Pensamos muitas vezes que a nossa mente e o nosso corpo são sistemas independentes, atuando separadamente sem influenciar o outro.
No entanto, (quase) todos nós já sentimos um acelerar do batimento cardíaco e da respiração, um aperto no estômago, ou um desconforto no intestino em situações em que estávamos nervosos ou muito tensos.
É precisamente o intestino e a sua ligação com as emoções que vamos explorar no texto de hoje.
Importa primeiro esclarecer, que o nosso organismo é, na verdade, um superorganismo. E não sendo super-heróis, somos, de facto, “povoados” por milhares de milhões de bactérias, fungos, vírus e protozoários que vivem nas nossas superfícies internas e externas.
Os microorganismos considerados mais importantes no nosso corpo são os do trato digestivo.
Estes estão envolvidos em diversas funções essenciais como:
- o metabolismo e a absorção de nutrientes;
- a digestão dos hidratos de carbono;
- a decomposição de proteínas;
- a degradação do ácido biliar;
entre outros.
As mudanças no nosso estilo de vida, a nível de alimentação, e cuidados de saúde tiveram um impacto nestes microorganismos e consequentemente na forma como desempenham as suas funções.
O que muitos de nós não sabemos, é o facto de existir um “cérebro intestinal” (em inglês gut-brain) que, ao contrário de outros órgãos, pode funcionar sem instruções por parte do cérebro, sendo responsável pelas funções intestinais mas também pela regulação do comportamento e das cognições. Deste modo, disfunções microbióticas podem estar na origem de perturbações neuronais e mentais.
É, assim, importante ter em atenção alguns fatores que interferem no desenvolvimento destes micro-organismos, como o stress materno, as infeções precoces e a utilização de antibióticos, uma vez que os mesmos também perturbam o funcionamento do cérebro e da mente humana.
Vários estudos demonstram ligações entre o temperamento e o caráter com os microrganismos intestinais. Similarmente, também o humor e as emoções são afetados pela microbiota dos intestinos – vários estudos demonstraram que a perturbação da microbiota dos intestinos, com recurso a stress ou antibióticos aumenta os níveis de comportamentos de tipo ansioso ou depressivo (Lurie et al., 2015; Frohlich et al., 2016; Slykerman et al., 2017; cit. por Shan, L., Xiaoli, W., & Feng, J.,2018).
Sabe-se, ainda, que a gestão do stress é influenciada pela microbiota do intestino, sendo esta uma parte constituinte do sistema de resposta ao stress.
Do ponto de vista clínico, foram encontradas associações entre a microbiota do intestino e uma variedade de perturbações do foro psicológico como a depressão, a ansiedade, a perturbação obsessivo-compulsiva e a perturbação bipolar (Weir, 2018; Shan, L., Xiaoli, W., & Feng, J., 2018). Por exemplo, entre os pacientes com perturbação bipolar, aqueles com níveis superiores de faecalibacterium tinham um melhor prognóstico, incluindo níveis mais reduzidos de ansiedade e depressão.
Este é um tema ainda controverso e com muitos aspetos por explorar, mas cada vez mais as evidências revelam a importância de pensarmos em nós mesmos como um todo, e de cuidarmos do nosso bem-estar físico e psicológico.
O que já fez por si hoje?
Weir, K.(2018). The future of psychobiotics: Evidence is mounting that microorganisms in the gut influence mental health—but designing a healthy microbiome won’t be easy. Monitor on Psychology, 49(11). American Psychological Association. Consultado em https://www.apa.org/monitor/2018/12/cover-psychobiotics.aspx.
Shan, L., Xiaoli, W., & Feng, J. (2018). Gut-Brain Psychology: Rethinking Psychology From the Microbiota–Gut–Brain Axis. Frontiers in Integrative Neuroscience, 12. DOI: 10.3389/fnint.2018.00033
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